O Rio Grande do Sul decretou estado de calamidade financeira nesta terça-feira, uma ação semelhante à tomada pelo Rio de Janeiro em junho deste ano. Em comum aos dois está o alto nível de gastos em relação às receitas. E eles não são os únicos em desequilíbrio fiscal preocupante: segundo especialistas, a julgar pelos números, Minas Gerais está no mesmo caminho.
O desequilíbrio entre receitas e despesas é comum aos três estados. Essa diferença vinha sendo reduzida no início da década, mas o caminho se inverteu depois disso. No caso de Minas Gerais, a trajetória decrescente durou até 2013.
Naquele ano, a dívida líquida era de 79,1 bilhões de reais e a receita, de 43,1 bilhões de reais. A partir de então, a redução do crescimento da China derrubou o preço das commodities – Minas é o maior produtor de minério de ferro do país, um dos principais produtos exportados pelo Brasil -, o que afetou o ritmo de alta da arrecadação do estado. Já as despesas seguiram em expansão. Em 2015, a dívida passou a 102,6 bilhões de reais, enquanto a receita ficou em 51,6 bilhões de reais, uma evolução prejudicial às contas públicas.
Em outras palavras: no intervalo de apenas dois anos, a dívida líquida cresceu 30% e a receita, 19%. “Se o estado não for o próximo a quebrar, é um dos próximos”, diz Ricardo Couto, professor do Ibmec.
O gasto cresceu por causa de fatores como contratações de funcionários públicos e concessão de benefícios a empresas. Isso dificulta um controle mais ágil das despesas, afirma Couto. “Essas contratações aconteceram em momentos de bonança”, diz. “Mas, depois de criada a despesa, não há como cortar.”
Assim como outros estados problemáticos, Minas, Rio e Rio Grande do Sul têm uma relação entre despesa com pessoal e receita corrente líquida acima da permitida pela Lei de Responsabilidade Fiscal, que é de 60%. Minas é a mais comprometida, segundo o Tesouro Nacional, com 78%.
A alta de despesas com funcionalismo em um momento de maior arrecadação até pode fazer algum sentido – e é permitida pela Lei de Responsabilidade Fiscal. O problema, segundo especialistas, está em atrelar uma despesa fixa e difícil de ser cortada, como aposentadoria e salários, a uma receita variável e incerta, como a arrecadação baseada em produção de commodities.
“Essa é a receita para o fracasso. A Lei de Responsabilidade Fiscal permite, mas o governante tem que pensar como um enxadrista, planejando alguns lances à frente”, compara Paulo Vicente, professor de finanças da Fundação Dom Cabral.
O sinal de alerta com as contas de Minas Gerais já foi dado também pelo Tesouro Nacional. Todo ano, o Tesouro atribui notas aos estados de acordo com a capacidade de cada estado de honrar seus compromissos. Em agosto, quando saiu a versão mais recente do relatório, os três estados com a pior nota eram justamente Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Minas Gerais. Os dois primeiros já decretaram estado de calamidade financeira.
Os conceitos do Tesouro vão de “A+”, para contas bem equilibradas, a “D-“, que indica desequilíbrio grave. Os três estados receberam a nota “D”, a segunda pior na escala do Tesouro Nacional.
E a crise não se limita às contas estaduais. De acordo com a Associação Mineira de Municípios, cerca de 70% das administrações municipais enfrentam dificuldades para pagar o 13º salário do funcionalismo público neste ano. O problema para a maioria é a queda na receita e o aumento das despesas.
Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro
O que motivou o governo do Rio Grande do Sul a decretar calamidade foi a avaliação de que não será possível pagar todas as suas contas com a receita atual. O estado projeta um déficit – ou seja, gasto além da receita – de 2,36 bilhões de reais para este ano.
E o desequilíbrio não é recente: entre 1971 e 2015, em apenas sete anos as receitas arrecadadas pelo estado foram maiores que suas despesas. De 1995 a 2015, apenas a gestão da governadora Yeda Crusius entregou as contas no azul ao fim do mandato.
O descompasso entre o que é arrecadado e o que é gasto é também a causa das dificuldades do Rio, mas a diferença estava em queda desde 2002. A situação começou a piorar a partir de 2011, por uma combinação entre aumento de despesas e queda nas receitas de impostos e de petróleo. “Quando há a ruptura, com queda dos preços do petróleo e da atividade económica, com gastos altos, a relação piora bastante. De maneira bastante simplificada, a receita caiu com um nível elevado de gastos”, avalia Ricardo Macedo, coordenador académico adjunto do Ibmec.
Procurada nesta terça-feira, a Secretaria da Fazenda de Minas Gerais informou que o secretário não poderia falar porque estava na reunião que tratava da dívida dos Estados, realizada em Brasília entre governadores, o presidente Michel Temer e a equipe Económica.
Vice dos direitos humanos admite que recebia mesada do PCC
Em depoimento à Polícia Civil, Luiz Carlos dos Santos confirmou que prestava serviços para a facção
Luiz Carlos Santos da CONDEPE fala com a imprensa em frente ao IML Central de São Paulo, após os cinco corpos dos jovens da zona leste foram encontrados em Mogi das Cruzes – 07/11/2016 (Renato S. Cerqueira/FuturaPress/Folhapress)
O vice-presidente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe), Luiz Carlos dos Santos, admitiu em depoimento à Polícia Civil de São Paulo que recebia uma mesada do PCC para prestar serviços à organização criminosa. Santos é um dos 55 alvos da Operação Ethos, que desmontou o núcleo jurídico da facção, a chamada “célula R” — cada integrante dela era chamado de R1, R2, R3 até o R41. Santos teve a prisão temporária (válida por 5 dias) prorrogada pela Justiça paulista nesta sexta-feira, no mesmo dia em que foi afastado do cargo pelo Condepe.
Em seu interrogatório, obtido com exclusividade pela VEJA, Santos diz que vinha sendo renumerado pelo PCC desde janeiro de 2015 e que só não recebeu neste mês porque a facção atrasou o pagamento. O objetivo inicial dos criminosos era que ele usasse de sua influência perante desembargadores e representantes do governo para interceder pelos membros da facção. Em seu depoimento, ele diz que recusou fazer esse tipo de trabalho, mas aceitou “auxiliá-los nos processos envolvendo reclamações contra o Sistema Prisional Paulista”. Muitas das queixas protocoladas por Santos eram falsas e acabaram sendo arquivadas, como por exemplo uma que dizia que um vidro fora encontrado na comida de uma penitenciária. O intuito final era, conforme ele próprio confirmou, reunir as denúncias e levá-las até a Organização das Nações Unidas (ONU) e a Corte Interamericana de Direitos Humanos.
Em um e-mail interceptado pela Polícia Civil, ele chega a cobrar 10.000 reais aos advogados do PCC para fazer uma vistoria no presídio de Presidente Bernardes, onde é cumprido o Regime Disciplinar Diferenciado (RDD) – o fechamento desse presídio é uma reivindicação antiga da facção. No início das tratativas, foi combinado que Santos receberia 2.000 reais mensais. Depois, a quantia subiu para 3.000, 4.500 e, enfim, 5.000 reais. A soma costumava ser depositada na conta de sua mulher.
Os dois Rs responsáveis por arregimentar Santos foram os irmãos advogados Davi e Vanila Gonçales, que também foram presos na terça. Diz um trecho do depoimento transcrito: “Foi procurado por Vanila no Condepe quando então ela fez a proposta de pagamento de 2.000 reais mensais ao interrogado para que ajudasse os amigos e clientes dela; indagado em que consiste exatamente essa ajuda, o interrogado diz que Vanila narrou que havia ingressado com revisões criminais perante o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo em nome de seus clientes e solicitava que o interrogado utilizasse sua influência de conselheiro para convencer os desembargadores; a pretensão era que o interrogado conversasse com o desembargador [Luiz Edmundo] Marrey, representante do Tribunal de Justiça perante o Condepe, para que ele interferisse nos demais desembargadores nos respectivos processos de interesse de Vanila”. A Polícia Civil diz que não encontrou nenhum indício de que os desembargadores atuaram em favor dos criminosos.
Em seu depoimento, Santos afirma que, logo em fevereiro de 2015, tentou se desvencilhar do esquema. Vanila, então, teria lhe dito que “não havia mais volta”. Ele teve noção clara de que estava sendo ameaçado, quando num certo dia um motoqueiro desconhecido o surpreendeu na frente de casa com a foto dos filhos, segundo Santos. A Polícia Civil considera que parte das declarações do conselheiro fazem parte da sua estratégia de defesa de dizer que foi coagido. A corporação também informou que, se ele requisitar, poderá entrar num programa de proteção por causa das ameaças.